Vale não tem ideia do que ocorreu com a barragem e espera grande número de vítimas
Relatório da alemã TUV SUD, emitido em 26 de setembro de 2018, não indicou problemas na barragem
Visivelmente abatido, o diretor-presidente da Vale, Fabio
Schvartsman, participou de uma rápida coletiva de Imprensa realizada no início
da noite do rompimento (25/01), na sede da empresa, no Rio de Janeiro, antes de
embarcar para Minas Gerais. Ainda sem saber o que de fato ocorreu com a
barragem I de Feijão para leva-la ao rompimento e ocasionar o transbordamento
de uma segunda estrutura da empresa no local, Schvartsman ressaltou o foco, no
momento, no socorro às vítimas, já antecipando uma tragédia bem maior do ponto
de vista humano, que a provocada pelo rompimento da barragem Fundão, da Samarco.
A surpresa da Vale, segundo ele, é porque a última leitura do monitoramento,
realizada em 10 de janeiro, não indicou problemas. E em 26 de setembro do ano
passado o relatório fornecido pela empresa alemã TUV SUD atestava a perfeita estabilidade
do sistema.
Ele também confirmou que, até o momento, a informação correta
é que uma barragem se rompeu e uma segunda barragem transbordou porque parte do
vazamento se dirigiu até ela. A barragem que rompeu é Feijão I. O material do
rejeito é basicamente sílica e o volume da barragem I é de 12 milhões de m3.
“É uma enorme tragédia, nos pegou totalmente de surpresa e eu
estou completamente dilacerado. Acabei de voltar do exterior e só não estou
ainda em Brumadinho pelo temporal que cai aqui no Rio de Janeiro, mas após a
entrevista coletiva irei para lá para dar todo o apoio às vítimas desse
terrível acidente. Esses acidentes são o pior que uma pessoa pode ter na vida.
É importante que saibam que a maioria dos atingidos são nossos funcionários.
Tínhamos aproximadamente 300 funcionários próprios e de terceiros trabalhando
no local. Não sabemos quantos foram acidentados porque houve um soterramento
pelo produto vazado da barragem. É também importante que saibam que essa é uma barragem
inativa, há mais de três anos não opera e estava em processo de
descomissionamento. Ela sequer vinha recebendo rejeitos de mineração. É uma
barragem antiga, que era da Ferteco, uma empresa adquirida pela Vale há muitos
anos. Temos auditorias externas feitas por empresas especializadas, inclusive
alemãs, que atestam a estabilidade dessa barragem e isso é feito
periodicamente. São todas informações muito recentes, então daí a nossa surpresa
e desalento”, afirmou Schvartsman.
“Nossa preocupação nesse instante é em atender os atingidos
por essa tragédia. Não pouparemos esforços. Temos um gabinete de crise, toda a
empresa está mobilizada e todos os diretores estão diretamente envolvidos neste
trabalho. Mobilizamos todas as ambulâncias que temos na região, aproximadamente
40, para atendimento das vítimas. Estamos complementando o que os hospitais públicos
são capazes de atender com vagas adicionais em hospitais privados para todas as
vitimas terem atendimento completo. Montamos três centros de atendimento para
as vítimas, inclusive com presença de psicólogos, para assessorar as pessoas
nessa hora de sofrimento terrível”, destacou. O presidente da Vale também
explicou que em um acidente dessas proporções, quem tem a responsabilidade
primária são os governos federal e estadual, mas que a Vale está prestando toda
a colaboração, sem nenhuma restrição, com ambulâncias e helicópteros, mas sob
coordenação do Corpo de Bombeiros e autoridades federais e estaduais.
Sobre o relatório da Agência Nacional de Águas indicar um
alto potencial de dano, ele destacou que “qualquer barragem que se rompa tem
alto potencial. O relatório também diz que risco é baixo e atesta pela
estabilidade da barragem. Quando uma barragem rompe o efeito é devastador. Por
isso é que se toma tanto cuidado para que isso não aconteça”.
Ao ser questionado por uma jornalista sobre uma suposta denúncia
feita à Rádio CBN por um prestador de serviço, de que em novembro teria ocorrido
um vazamento e que foi realizado um reparo com concreto, o presidente da Vale
alegou desconhecer tal fato.
“A preocupação da Vale com vazamento de barragem ou qualquer
problema desse tipo é enorme, especialmente após o acidente de Fundão. A Vale
redobrou os cuidados e fez tudo que existe de mais moderno do ponto de vista de
verificação da estabilidade dos seus sistemas. Não obstante, quero reforçar que
não é essa a questão, nesse momento, que me preocupa. O tempo permitirá que
todas essas questões sejam esclarecidas com o devido rigor. Agora estamos
preocupados 200% em socorrer as pessoas atingidas. Ampliamos enormemente as
ações que tomamos em relação às nossas barragens após a Samarco. Execução de
revisões periódicas de segurança de barragens com empresas especialistas do
Brasil, revisões feitas também por empresas estrangeiras, planos de ações emergenciais
detalhados, execução de auditorias externas, implantação de sistemas de sirenes
modernos para alertas de sistemas de emergência”, diz o presidente.
Sobre as sirenes talvez não terem sido acionadas, como tem
sido veiculado na mídia, o presidente informa que a Vale não sabe confirmar se
isso de fato ocorreu. “É provável que tenham funcionado, mas foi tudo muito
rápido, o rompimento provocou uma ação muito violenta e rápida”, lamentou.
Os funcionários da Vale tiveram seu restaurante soterrado e
isso ocorreu na hora do almoço. E o prédio administrativo também foi atingido. “Tínhamos
cerca de 300 pessoas trabalhando no local, mas não sabemos quantas estavam no
restaurante, área administrativa ou fora dali. Foram encontradas mais de 100
pessoas, aproximadamente. Não podemos afirmar, no momento, quantos estão
desaparecidos. Não temos informações sobre danos à população em geral”,
explicou.
Ao ser questionado sobre a similaridade com a tragédia da Samarco:
“Dessa vez é uma tragédia humana. Estamos falando de uma quantidade provável
grande vítimas. Não sabemos quantas são, mas sabemos que será um número grande
e possivelmente o dano ambiental dessa vez será menor. A barragem estava desativada
e o material dentro dela já era razoavelmente seco e não tem esse poder de se
deslocar por longas regiões. A parte ambiental dessa vez deve ser muito menor e
a tragédia humana terrível. Sobre contaminação, a barragem só continha sílica,
então a chance de contaminação é muito pequena ou nenhuma”, afirma.
Um jornalista questionou o presidente da Vale sobre a
informação de que, em dezembro de 2008, a Vale teria obtido licença para
ampliar as minas de feijão e jangada. Então como a barragem estava em
descomissionamento? O presidente da Vale informou que eram utilizadas outras
barragens com capacidade de armazenamento. Mas ressalta que não conhece a situação
específica, está respondendo de forma hipotética. O natural é que se existe uma
intenção de ampliação outras barragens podem ser utilizadas se uma está em
descomissionamento.
Ele afirmou ainda que a Vale está fazendo monitoramento
muito próximo e qualquer sinal de problema, em qualquer barragem, a empresa
será a primeira a dar o alerta. “A
última coisa que queremos é mais acidentes na região”, disse. Ele não sabe
informar se outras barragens poderiam ter problemas.
Um dos jornalistas presentes na coletiva lembra que quando
ele assumiu, em 2017, falou que o lema da empresa seria “Mariana nunca mais” e menos
de dois anos depois a empresa passa por essa situação novamente. “Sobre isso,
tenho dois recados: primeiro, minha enorme consternação, minha tristeza, estou dilacerado mesmo, é algo que me virou do avesso. Em segundo lugar, não sabemos
o que aconteceu. Não acho que a hora é de procurar o que aconteceu, mas nós
faremos isso e faremos com energia e rapidez e tomaremos as medidas que forem necessárias
para resolver o problema, que não pode acontecer. Mas não sabemos o que houve
com essa barragem. É muito cedo para qualquer
pessoa ter essa informação.
Sobre os possíveis impactos na produção, o presidente da
Vale ressaltou que não está preocupado com isso no momento. Que a preocupação é
em relação às vítimas. Não tem problema nenhum sobre produção, o problema
terrível são essas pessoas que foram impactadas.
Sobre a possibilidade dos rejeitos atingirem o rio São
Francisco, ressaltou que o rejeito não correrá para lugar nenhum, ficará onde está
nesse momento. Pelo menos é o que os técnicos acreditam.
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