Vale não tem ideia do que ocorreu com a barragem e espera grande número de vítimas

Relatório da alemã TUV SUD, emitido em 26 de setembro de 2018, não indicou problemas na barragem

Por Conexão Mineral 25/01/2019 - 23:34 hs
Foto: Vale
Vale não tem ideia do que ocorreu com a barragem e espera grande número de vítimas
"Estou dilacerado, é algo que me virou do avesso", diz diretor-presidente da Vale, Fabio Schvartsman

Visivelmente abatido, o diretor-presidente da Vale, Fabio Schvartsman, participou de uma rápida coletiva de Imprensa realizada no início da noite do rompimento (25/01), na sede da empresa, no Rio de Janeiro, antes de embarcar para Minas Gerais. Ainda sem saber o que de fato ocorreu com a barragem I de Feijão para leva-la ao rompimento e ocasionar o transbordamento de uma segunda estrutura da empresa no local, Schvartsman ressaltou o foco, no momento, no socorro às vítimas, já antecipando uma tragédia bem maior do ponto de vista humano, que a provocada pelo rompimento da barragem Fundão, da Samarco. A surpresa da Vale, segundo ele, é porque a última leitura do monitoramento, realizada em 10 de janeiro, não indicou problemas. E em 26 de setembro do ano passado o relatório fornecido pela empresa alemã TUV SUD atestava a perfeita estabilidade do sistema.

Ele também confirmou que, até o momento, a informação correta é que uma barragem se rompeu e uma segunda barragem transbordou porque parte do vazamento se dirigiu até ela. A barragem que rompeu é Feijão I. O material do rejeito é basicamente sílica e o volume da barragem I é de 12 milhões de m3.

“É uma enorme tragédia, nos pegou totalmente de surpresa e eu estou completamente dilacerado. Acabei de voltar do exterior e só não estou ainda em Brumadinho pelo temporal que cai aqui no Rio de Janeiro, mas após a entrevista coletiva irei para lá para dar todo o apoio às vítimas desse terrível acidente. Esses acidentes são o pior que uma pessoa pode ter na vida. É importante que saibam que a maioria dos atingidos são nossos funcionários. Tínhamos aproximadamente 300 funcionários próprios e de terceiros trabalhando no local. Não sabemos quantos foram acidentados porque houve um soterramento pelo produto vazado da barragem. É também importante que saibam que essa é uma barragem inativa, há mais de três anos não opera e estava em processo de descomissionamento. Ela sequer vinha recebendo rejeitos de mineração. É uma barragem antiga, que era da Ferteco, uma empresa adquirida pela Vale há muitos anos. Temos auditorias externas feitas por empresas especializadas, inclusive alemãs, que atestam a estabilidade dessa barragem e isso é feito periodicamente. São todas informações muito recentes, então daí a nossa surpresa e desalento”, afirmou Schvartsman.

“Nossa preocupação nesse instante é em atender os atingidos por essa tragédia. Não pouparemos esforços. Temos um gabinete de crise, toda a empresa está mobilizada e todos os diretores estão diretamente envolvidos neste trabalho. Mobilizamos todas as ambulâncias que temos na região, aproximadamente 40, para atendimento das vítimas. Estamos complementando o que os hospitais públicos são capazes de atender com vagas adicionais em hospitais privados para todas as vitimas terem atendimento completo. Montamos três centros de atendimento para as vítimas, inclusive com presença de psicólogos, para assessorar as pessoas nessa hora de sofrimento terrível”, destacou. O presidente da Vale também explicou que em um acidente dessas proporções, quem tem a responsabilidade primária são os governos federal e estadual, mas que a Vale está prestando toda a colaboração, sem nenhuma restrição, com ambulâncias e helicópteros, mas sob coordenação do Corpo de Bombeiros e autoridades federais e estaduais.

Sobre o relatório da Agência Nacional de Águas indicar um alto potencial de dano, ele destacou que “qualquer barragem que se rompa tem alto potencial. O relatório também diz que risco é baixo e atesta pela estabilidade da barragem. Quando uma barragem rompe o efeito é devastador. Por isso é que se toma tanto cuidado para que isso não aconteça”.

Ao ser questionado por uma jornalista sobre uma suposta denúncia feita à Rádio CBN por um prestador de serviço, de que em novembro teria ocorrido um vazamento e que foi realizado um reparo com concreto, o presidente da Vale alegou desconhecer tal fato.  

“A preocupação da Vale com vazamento de barragem ou qualquer problema desse tipo é enorme, especialmente após o acidente de Fundão. A Vale redobrou os cuidados e fez tudo que existe de mais moderno do ponto de vista de verificação da estabilidade dos seus sistemas. Não obstante, quero reforçar que não é essa a questão, nesse momento, que me preocupa. O tempo permitirá que todas essas questões sejam esclarecidas com o devido rigor. Agora estamos preocupados 200% em socorrer as pessoas atingidas. Ampliamos enormemente as ações que tomamos em relação às nossas barragens após a Samarco. Execução de revisões periódicas de segurança de barragens com empresas especialistas do Brasil, revisões feitas também por empresas estrangeiras, planos de ações emergenciais detalhados, execução de auditorias externas, implantação de sistemas de sirenes modernos para alertas de sistemas de emergência”, diz o presidente.

Sobre as sirenes talvez não terem sido acionadas, como tem sido veiculado na mídia, o presidente informa que a Vale não sabe confirmar se isso de fato ocorreu. “É provável que tenham funcionado, mas foi tudo muito rápido, o rompimento provocou uma ação muito violenta e rápida”, lamentou.

Os funcionários da Vale tiveram seu restaurante soterrado e isso ocorreu na hora do almoço. E o prédio administrativo também foi atingido. “Tínhamos cerca de 300 pessoas trabalhando no local, mas não sabemos quantas estavam no restaurante, área administrativa ou fora dali. Foram encontradas mais de 100 pessoas, aproximadamente. Não podemos afirmar, no momento, quantos estão desaparecidos. Não temos informações sobre danos à população em geral”, explicou.

Ao ser questionado sobre a similaridade com a tragédia da Samarco: “Dessa vez é uma tragédia humana. Estamos falando de uma quantidade provável grande vítimas. Não sabemos quantas são, mas sabemos que será um número grande e possivelmente o dano ambiental dessa vez será menor. A barragem estava desativada e o material dentro dela já era razoavelmente seco e não tem esse poder de se deslocar por longas regiões. A parte ambiental dessa vez deve ser muito menor e a tragédia humana terrível. Sobre contaminação, a barragem só continha sílica, então a chance de contaminação é muito pequena ou nenhuma”, afirma.

Um jornalista questionou o presidente da Vale sobre a informação de que, em dezembro de 2008, a Vale teria obtido licença para ampliar as minas de feijão e jangada. Então como a barragem estava em descomissionamento? O presidente da Vale informou que eram utilizadas outras barragens com capacidade de armazenamento. Mas ressalta que não conhece a situação específica, está respondendo de forma hipotética. O natural é que se existe uma intenção de ampliação outras barragens podem ser utilizadas se uma está em descomissionamento.

Ele afirmou ainda que a Vale está fazendo monitoramento muito próximo e qualquer sinal de problema, em qualquer barragem, a empresa será a primeira a dar o alerta.  “A última coisa que queremos é mais acidentes na região”, disse. Ele não sabe informar se outras barragens poderiam ter problemas.

Um dos jornalistas presentes na coletiva lembra que quando ele assumiu, em 2017, falou que o lema da empresa seria “Mariana nunca mais” e menos de dois anos depois a empresa passa por essa situação novamente. “Sobre isso, tenho dois recados: primeiro, minha enorme consternação, minha tristeza, estou dilacerado mesmo, é algo que me virou do avesso. Em segundo lugar, não sabemos o que aconteceu. Não acho que a hora é de procurar o que aconteceu, mas nós faremos isso e faremos com energia e rapidez e tomaremos as medidas que forem necessárias para resolver o problema, que não pode acontecer. Mas não sabemos o que houve com essa barragem.  É muito cedo para qualquer pessoa ter essa informação.

Sobre os possíveis impactos na produção, o presidente da Vale ressaltou que não está preocupado com isso no momento. Que a preocupação é em relação às vítimas. Não tem problema nenhum sobre produção, o problema terrível são essas pessoas que foram impactadas.

Sobre a possibilidade dos rejeitos atingirem o rio São Francisco, ressaltou que o rejeito não correrá para lugar nenhum, ficará onde está nesse momento. Pelo menos é o que os técnicos acreditam.